Na semana que passou surgiu um debate interessante, na disciplina de investimentos, em uma de minhas turmas de graduação. Em meio as explicações e discussões sobre o binômio do risco e retorno, pedi aos alunos para enfocarem a questão pela ótica do nível de aversão ou tolerância ao risco do investidor.
Ao longo do debate surgiu a pergunta sobre por que as pessoas investem. Existem diferentes formas de abordar o assunto e eu preferi convidá-los a fazer a reflexão pelo ângulo da motivação. Motivação é fruto de uma tensão provocada por uma necessidade latente. Ou seja, a percepção de que precisamos de algo gera um impulso que nos motiva a desejar algo.
Dessa forma, partindo de um estado atual, em que algo nos desagrada ou nos incomoda, criamos a expectativa de atingir outro estado, o desejável, nossa meta. Deste gap surge o impulso que nos motiva a tomar decisões e adotar comportamentos.
Expectativas sobre nós mesmos e desejos não são construções simples. No caldo em que se formam estão impulsos biológicos, crenças formadas na cultura em que vivemos e as mais intrínsecas emoções. O caminho da motivação, e da decisão, contudo não é uma linha reta. Quem já não foi em um restaurante vegetariano apenas para agradar uma namorada? A despeito de predileção por um belo bife, prevaleceu o desejo de agradar sua parceira.
A motivação para investir se situa entre dois grandes impulsos: a necessidade de segurança e o desejo de acumular riqueza. Vamos utilizar a estratégia das três reservas para explicar.
Uma boa estratégia para gestão de seu capital é dividir suas economias em três reservas. A primeira reserva é a de emergência, um valor que deve estar disponível a qualquer hora e a salvo das oscilações de mercado. Este capital se destina a cobrir gastos imprevistos, aquele tipo de situação inesperada como uma interrupção do seu fluxo de caixa ou uma despesa hospitalar.
Por conta desta imprevisibilidade, estes recursos devem estar protegidos de qualquer possibilidade de desvalorização e estar disponíveis imediatamente.
A segunda reserva é para a preservação de capital. Esta deve atender a necessidade de acumulação de recursos no longo prazo para permitir, pelo menos em parte, a manutenção de seu padrão de vida. Na fase de aposentadoria, por exemplo.
Esses recursos devem estar aplicados em ativos que podem oferecer algum risco moderado de oscilação. De forma simples, trata-se daquele capital que tende a crescer devagar e sempre, com remota possibilidade de uma leve balançada de curto prazo.
A terceira reserva é para apreciação de capital. A expectativa para esses recursos aqui investidos é de que atinjam alta valorização e provoquem aumento de sua riqueza no longo prazo. Se der tudo certo, você poderá contar com estes recursos para financiar alguns luxos no futuro, por exemplo viagens.
Como o risco é “simétrico”, onde se espera forte alta deve-se estar preparado para forte perda. Sendo assim, neste terceiro pote só devem estar aplicados recursos que você poderia perder. Ou seja, uma parcela menor de suas economias que não fará falta no caso de suas apostas sucumbirem ao mercado. Vale ressaltar, não fazer falta não significa que não causará dor. É inevitável.
A reserva de emergência está associada a necessidade de segurança. Estamos sujeitos a desemprego, perda de clientes, pandemias e outros eventos fortuitos da vida. Abrir mão dela é uma decisão, consciente ou não, em aceitar o risco de se ver sem recursos para fazer frente às necessidades básicas.
A reserva de preservação está mais associada a segurança também. Contudo, como seu objetivo é de longo prazo, ela comporta ativos com algum risco como forma de cobrir a inflação do período. Os pequenos ganhos serão valiosos para evitar a erosão do capital.
Já a reserva de apreciação de capital, esta está mais relacionada a busca pelo lucro e, para tanto, o investidor deve estar ciente de que a possibilidade de perda é material, relevante.
Decisões de consumo em geral são orientadas pelo prazer, posicionamento social, ostentação etc. Elas atendem a motivação de preencher o gap entre como estamos e como gostaríamos de estar.
Já as decisões de investimento estão relacionadas em grande parte ao perigo, a necessidade de proteção e remontam a sobrevivência. Mesmo naquelas decisões motivadas pelo desejo de multiplicar a riqueza, não é possível descartar o perigo da perda.
Ao projetar suas reservas pense bem em seus objetivos de vida, analise com cuidado o trade-off entre segurança e risco e tente descobrir o que, de fato, lhe motiva a investir seus recursos.
(Fonte: Valor Investe)
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