Às vésperas do Dia das Crianças, diversas famílias costumam ir aos shoppings na busca para encontrar os mais variados presentes solicitados pelos filhos. Com a pandemia, no entanto, muitas delas precisaram reduzir as despesas para conseguir arcar com os gastos fixos. Em decorrência do atual cenário atípico, a data deste ano pode ser uma boa oportunidade para introduzir a educação financeira na vida dos pequenos.
Para a assessora de investimentos e sócia-fundadora do escritório Ikedo Investimentos, Luciana Ikedo, é importante abordar o assunto desde cedo para que as crianças possam construir uma relação saudável com o dinheiro.
“É essencial para que elas cresçam sabendo administrar as suas finanças de forma natural. Aprender, ainda na infância, que é preciso gastar menos do que ganha, adiando os desejos de consumo e investindo bem o recurso excedente, pode levar a uma vida mais equilibrada e feliz“, afirma.
O presidente e fundador da Magnetis, Luciano Tavares, complementa ao dizer que “sem aprender a lidar com dinheiro desde pequenas, as crianças correm maior risco de se tornar adolescentes consumistas e adultos sem controle financeiro“.
Tavares acredita que adotar o clássico “cofrinho” seja um bom ponto de partida para crianças menores aprenderem sobre o conceito de poupar e se planejar.
“Isso é importante para já desenvolver o hábito de separar em ‘caixinhas’ e poupar desde cedo. Conforme a criança vai crescendo, pode ser interessante criar uma carteira de investimentos que ela possa acompanhar os rendimentos e entender conceitos mais complexos“, destaca.
Além disso, de acordo com Luciana, o “cofrinho”, em formato de porquinho, pode trazer algumas lições, como fugir do impulso das compras, dificultar o acesso ao dinheiro, manter o controle das receitas e o cuidado com o ciclo de acumulação e endividamento.
“Segundo o Raio-x do investidor de 2019, 56% dos entrevistados não tinham qualquer investimento financeiro em 2018. São pessoas que gastam tudo o que ganham, não pensando nem na reserva de emergência e tampouco na aposentadoria”, conta a sócia-fundadora da Ikedo Investimentos. Ela ainda questiona: “você já imaginou, em 20 anos, o quanto o controle das pequenas despesas pode fazer diferença na construção da sua independência financeira?“.
Já para o professor e especialista em Fundos Imobiliários da Suno Research, Marcos Baroni, adotar métodos práticos da vida profissional pode ser um caminho mais eficiente para a criança se tornar consciente quanto ao uso do dinheiro.
“Nós precisamos conversar sobre trabalho, renda e despesa com elas. Em um primeiro momento, ensinar a lavar um carro, por exemplo. Depois, é quando a criança consegue entender que aquilo é remunerado. Com isso, ela já compreende que é possível gerar uma renda e aplicá-la para não precisar fazer o trabalho de novo. Por fim, temos a despesa: quando ela crescer e começar a trabalhar, vai dar valor ao dinheiro que conseguiu obter por conta própria”, explica.
Para Tavares, adotar a estratégia da mesada semanal ou mensal pode ser um instrumento interessante para ensinar à criança como montar um planejamento financeiro.
“Aprender a poupar, ser capaz de postergar gratificação e entender conceitos de juros compostos são alguns dos benefícios que se tem ao inserir o método da mesada. A recorrência e previsibilidade da mesada são importantes para que a criança aprenda a se planejar”, conclui.
Ele conta que, dentro de casa, estabeleceu essa regra com o seu filho pequeno, que pediu a primeira mesada aos 6 anos.
“Combinei que ele sempre deve separar a mesada em 3 partes. Uma parte para gastos mais imediatos (comprar figurinha), uma parte que ele vai acumular para uma compra maior (brinquedo) e uma parte que vai guardar pro longo prazo (porquinho). Isso é fundamental para já desenvolver o hábito de separar em “caixinhas” e poupar desde cedo”.
De acordo com Tavares, para os pais que já têm crianças mais velhas, ensinar conceitos mais avançados, como juros (remunerar o dinheiro guardado), riscos (alocar em apostas com ganhos ou perdas) e méritos (receber mais se realizar certos objetivos) pode ser uma boa opção para introduzir o assunto. Além das dicas, ele chama atenção para quem tem mais de um filho.
“Tome cuidado para não parecer que está favorecendo algum deles com valores diferentes e evite reforçar conceitos como ‘menina’ recebe menos do que ‘menino‘”, afirma.
Outra alternativa para abordar o tema com os filhos, segundo Luciana, é inserir a criança em alguma tomada de decisão para estimulá-la a olhar para o dinheiro de uma maneira mais consciente.
“Incluir a criança no processo decisório pode ampliar a visão estratégica sobre as decisões financeiras, fazendo com que esse seja um processo natural e discutido abertamente, e não como um tabu. O ‘trade off’, que em economia é um termo muito utilizado e traduz o fato de que, ao escolher uma opção, deixamos para traz todas as outras, pode significar adultos mais conscientes e menos endividados no futuro“, acrescenta.
Luciana comenta sobre a relação das suas duas filhas, de 11 e 13 anos, com o dinheiro. Segundo a assessora de investimentos, os assuntos financeiros são tratados de forma aberta, sempre envolvendo as meninas nas discussões.
“Criamos as cotas para as idas às compras e para as viagens, fazendo com que cada uma delas administre os próprios recursos e façam as suas escolhas, entendendo que o dinheiro é finito e que é preciso ter prioridades, abrindo mão daquilo que é menos relevante“, conta.
Ela revela ainda que a mais velha, de 13 anos, já passou pelo processo de “bancarização”. “Concedemos um cartão de crédito para que ela conheça os produtos financeiros e que esteja preparada para um mundo em que o PIX, os bancos digitais e as plataformas abertas de investimentos são realidade e que estarão presentes em suas vidas em um futuro muito próximo”, afirma.
Para Marcos Baroni, ensinar os filhos a investir também é importante para instigar a independência financeira desde cedo.
“Abrir uma conta em uma corretora, ensinar a criança a investir, a ter o benefício da renda passiva e manter o dinheiro atualizado no tempo pode ser mais relevante que alimentar o ‘porquinho’.
Por exemplo, você pode ensinar como comprar uma cota de um fundo imobiliário de shopping. E aí, quando o dividendo cair na conta, você leva ela para comprar uma casquinha de sorvete com o dinheiro obtido com o lucro do investimento”, explica.
(Fonte: Valor Investe)